N´Dinga Mbote é uma personalidade incontornável na mais recente história do Vitória Sport Clube, uma vez que o representou em 286 partidas no Campeonato Nacional da 1ª Divisão ao longo das 10 temporadas consecutivas em que envergou a camisola com o emblema do Rei D. Afonso Henriques, o que o torna, neste aspecto, um recordista no clube.
Na verdade, N´Dinga é oficialmente o jogador com mais jogos disputados na principal competição nacional de futebol com a camisola do Vitoria de Guimarães. Foram 10 épocas consecutivas de muitas glórias, conquistas, e também algumas tristezas e desilusões. O nome N´Dinga Mbote é toda uma instituição no Vitoria Sport Clube.
A sua história de vida e desportiva, que de seguida iremos recuperar, está inundada de curiosidades e o seu nome encontra-se ligado a alguns dos mais polémicos casos do futebol português e do vitoriano em particular.
Nasceu no dia 11 de Setembro de 1966 na cidade de Kinshasa, na actual RD Congo, antigo Zaire. Foi várias vezes internacional zairense, representando o seu país em inúmeras competições disputadas entre selecções nacionais. Fez praticamente toda a sua carreira no futebol português, mas deixou também a sua marca histórica no Zaire, onde é reconhecido como um dos melhores jogadores daquele país.
O seu nome é N´Dinga Mbote. Mas aqui começa a primeira curiosidade da história que relatamos sobre N´Dinga. É que, de facto, N´Dinga começou por se chamar de Philippe N´Dinga, seu nome de nascença, todavia, este filho de um pastor protestante teve de alterar o seu primeiro nome, depois de Mobutu, Presidente do Zaire, ordenar que se anulassem todos os nomes franceses dos cidadãos daquele país. Por esse motivo, N´Dinga teve que substituir no seu nome Philippe por Mbote.
N´Dinga era na sua vida social um homem extremamente simples, amigo de toda a gente, imensamente simpático com todos aqueles que viviam na terra que o acolheu. Na cidade de Guimarães fez muitos amigos e os sócios ou adeptos do Vitoria revelam um sentimento de reconhecimento por este atleta.
Como jogador N´Dinga era incomparável e inconfundível. Como N´Dinga ao seu jeito só me recordo do internacional francês Jean Tigana. Aquele seu modo desarticulado e ziguezagueante que impendia na sua forma de estar dentro do terreno de jogo era a sua verdadeira imagem de marca. Parecia uma verdadeira enguia a serpentear em dribles sucessivos entre os defesas.
Tinha uma excelente capacidade técnica, era franzino de corpo, mas com uma energia inesgotável. A sua capacidade física revelava-se no facto de muitas vezes, ao assistirmos aos seus jogos, ficarmos com a sensação que após aqueles 90 minutos de jogo, N´Dinga demonstrava suficiente frescura para realizar mais uma partida futebol logo de seguida.
N´Dinga tacticamente ocupava qualquer lugar na linha média. No Vitoria ele desempenhou funções de extremo direito, foi médio interior, jogou como n.º 10, foi trinco, foi lateral direito e até a libero o vi jogar. Era daqueles jogadores que qualquer treinador podia confiar e de uma ampla utilidade em face da versatilidade que apresentava.
No passe era seguro, com boa visão de jogo, exímio a tratar o esférico e com uma capacidade de drible invulgar. Na marcação, antecipação e desarme era irrepreensível. No seu estilo desengonçado, o seu jogo de cabeça e a técnica de remate é que não era ponto forte.
Acima de tudo N´Dinga era um pulmão com uma inesgotável energia física, um exemplar jogador de equipa, com excelentes performances exibicionais já que raramente se encontrava em baixo de forma ou sequer padecia de qualquer lesão. Com ele a bitola estava sempre elevada e por esse motivo foi durante 10 anos, após sucessivos técnicos e muitos companheiros de equipa, um titular indiscutível nas variadas formações do Vitoria Sport Clube.
N´Dinga iniciou a sua carreira no seu país. Curiosamente nunca esteve no futebol jovem e com apenas 16 anos de idade começou imediatamente a jogar na 1ª Divisão Nacional do Zaire no Ruwensor. Este jogador foi directamente das ruas onde jogava futebol com os amigos para os campos de futebol da 1ª Divisão Nacional.
Na verdade, N´Dinga não era na altura um verdadeiro apaixonado pelo futebol, dedicando-se muito mais do seu tempo aos estudos, na área da electrónica.
Do Ruwensor transferiu-se para o DC Motema Pembe Kinshasa, um dos maiores clubes do antigo Zaire, como a mais cara e disputada transferência da história do futebol zairense ate aquela altura. Ao serviço desse grande clube do qual era titular indiscutível foi chamado pela primeira vez à Selecção Nacional A do Zaire, onde se estreou com apenas 18 anos de idade, num jogo frente ao Gabão. A estreia pela Selecção Nacional do seu país foi de resto muito feliz e marcante para N´Dinga, que entrou no terreno de jogo apenas na segunda parte, quando o resultado estava ainda empatado a 0-0. O Zaire acabaria por levar de vencida a partida frente ao Gabão por 2-0 com o segundo golo a ser apontado pelo jovem N´Dinga.
Todavia a vida de N´Dinga levaria uma volta de 180 graus. O seu sossego terminou quando decidiu assinar contrato com o AS Vita Clube, simplesmente o maior rival do DC Motema Pembe Kinshasa. Essa transferência não foi obviamente bem acolhida pelos fanáticos adeptos do seu anterior clube. N´dinga teve que sobreviver a tentativas de agressão, ameaças de morte, a perseguições e a autenticas fugas “Hollywoodescas”.
N´Dinga percebeu que não poderia continuar mais tempo no Zaire e por esse motivo decidiu abandonar o seu país, assumindo a qualidade de profissional de futebol e tentando a sorte no futebol europeu. N´Dinga apesar de ter contrato assinado com o AS Vita Clube nunca chegou a representar aquele clube.
N´Dinga Mbote e Basaula, outro jogador que viria a tornar-se atleta do Vitória, tinham praticamente definido que o seu destino seria os franceses do Nice. Todavia, pelo meio desta fuga do seu país surge a figura do empresário português Valter Ferreira que tinha relações privilegiadas com a Direcção do Vitoria Sport Clube. Valter Ferreira indica a Pimenta Machado, Presidente do Vitória, os nomes de N´Dinga e Basaula, e ainda o de N´Kama, outro jogador zairense que já se encontrava naquela altura em Portugal a prestar provas no SL Benfica.
O então Presidente do Vitória aceita a indicação do empresário Valter Ferreira e seguem os 3 zairenses para Guimarães onde iriam ser sujeitos a testes de aptidão. De resto, é por todos conhecidos o desfecho, pois todos eles acabaram por rubricar contrato com o Vitoria Sport Clube.
É pois, deste modo, que N´Dinga Mbote chega ao Vitória para integrar o plantel treinado pelo brasileiro Marinho Peres para a época de 1986/87. Época que de resto, é a todos os níveis sensacional e marcante para todos os vitorianos. Inclusive para N´Dinga, que desde de início da sua estada em Guimarães se fixou categoricamente como titular indiscutível no onze vimaranense.
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